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Reportagem No Fun At All, Artigo 21, To All My Friends @ RCA Club, 23-02-18

Poderia começar esta reportagem por dizer simplesmente “Surpreendente” e até centrar todo este artigo nessa perspectiva. No entanto isso seria válido apenas para quem não acompanha a cena punk/hardcore e como a mesma está muito bem viva no nosso país. Com lotação esgotada já há alguns dias antes da realização do espectáculo, o RCA Club recebia o regresso dos No Fun At All, uma das mais míticas bandas de punk rock vindas da Suécia, senão a mais mítica mesmo. A acompanhá-los estavam os nosso Artigo 21 e To All My Friends e foi precisamente estes últimos que iniciaram esta maratona de punk rock de alta qualidade.

Sabendo como funciona o público português – infelizmente – as primeiras bandas normalmente são sacrificadas mas felizmente que os concertos começaram um pouco mais tarde, o que fez com que os To All My Friends já tivessem uma audiência muito bem composta, ainda que algo tímida, quando iniciaram a sua prestação. A banda de Setúbal poderá ser recente mas definitivamente tem o coração no sítio certo, com um espírito punk rock melódico e acessível, é certo, mas também com conteúdo.

Os To All My Friends não tiveram dificuldade e contagiar os que estavam presentes com temas como “Forever With You” e “Complicated”, mesmo que o público (ainda em formação em termos de números) estivesse algo tímido em relação a viver a música. Alguns fãs mais desinibidos faziam a festa em frente ao palco, cantando o refrão das memoráveis “Friends” e “Take My Hand”. Apesar do set curto, foi um excelente iniciar para uma noite com um alto nível de energia. Sem dúvida que esperamos ver os To All My Friends mais vezes no futuro, uma das grandes promessas da cena punk rock melódica.

A continuar a falar em português (e neste caso, a cantar em português) tivemos os Artigo 21, que apesar de serem uma banda mais antiga em relação aos To All My Friends, não deixam de ser um dos nomes novos e promissores da cena nacional de punk rock – o seu início de carreira remonta a 2012. É um sentimento de familiaridade quando ouvimos punk rock em português. Um sentimento que se torna visceral no contexto em que os ouvimos. Ouvir temas como “Utopia”, “Máscara” e “Mudança” (este último a criar a primeira roda de bailarico da noite) é pensar em nomes saudosos do punk rock nacional de outrora. É senti-los.

Com uma sala ainda mais bem composta, os Artigo 21 subiram a fasquia da intensidade mas ainda parecia haver uma certa timidez por parte do público – excepção feita dos que se encontravam nas filas da frente em relação ao palco, que estavam incansáveis. Essa energia circulava entre a banda e público era palpável, não só pela performance da banda (que tal como os To All My Friends, não deixaram de referir a honra de estar em cima do palco do RCA Club e de agradecer à Hell Xis Records pelo convite) como também pela reacção do público que aos poucos começava a desinibir-se e a soltar-se.

Teve-se ainda direito a alguns temas novos – os Artigo 21 asseguraram que a próxima vez que os víssemos seria já com um trabalho novo às costas – que garantem a continuidade no bom som da banda. “Tentar Não Vacilar” e “Ilusão” foram as malhas novas e que nos fazem criar uma boa expectativa em relação ao futuro. O concerto terminou com aquele que já é o hino da banda e que foi entoado de forma apoteótica por quase todo o RCA Club: “Espera Por Mim”. Os Artigo 21, assim como os To All My Friends antes, provaram que vale a pena chegar a horas para ver e apoiar as bandas de abertura, sobretudo quando são nacionais. Não por serem nacionais mas sobretudo por terem tanto ou mais valor que as internacionais. É uma das grandes conclusões que podemos retirar daquela noite.

Outra conclusão é que os No Fun At All são uma banda sobrenatural. Ao nível daqueles vilões em filmes de terror que insistem em voltar por mais coisas que sofram. A banda está a viver a sua terceira encarnação, já tem uma longa carreira mas a avaliar pela energia com que abordaram os mais de vinte temas debitados, não nos parece que tenham intenções de abrandar no futuro mais próximo. Se caso tenham algum momento de dúvida nos tempos mais próximos, temos a certeza que a forma como foram recebidos servirá como forma de incentivo.

Poderá parecer exagero mas podemos jurar que ínfimos segundos depois dos suecos debitarem a primeira nota da sua actuação, era formada a primeira roda (de proporções gigantescas) e imediatamente tínhamos corpos a voar como se estivéssemos num concurso para ver quem é que conseguia vencer a gravidade de forma mais convincente. Foi um pequeno espectáculo à parte, digno de ser visto. Também digno de ser visto foi a entreajuda que houve quando alguém tropeçava e/ou caía, surgindo sempre alguém pronto para ajudar a recuperar. Caos com sentido.

Os mais estranhos a este tipo de coisas poderiam pensar que a diversão do público acabava por ser uma distracção em relação ao que se passava em cima do palco, mas ver os membros da assistência que estavam no meio da roda a voltar-se para o palco para entoar os refrães de temas como “Suicide Machine”, “Mine My Mind” (este não só teve o refrão entoado como o próprio riff de abertura) e “Perfection” tirava qualquer tipo de dúvida que subsistisse. A certa altura Ingemar Jansson, o vocalista dos No Fun At All pergunta de forma irónica se o público gostava de cantar. Se a voz faltasse ao vocalista, era sabido que haveria um substituto à altura.

Apesar da banda não editar nenhum álbum há já algum tempo, não deixaram de dar boas notícias nesse departamento. A banda tocou algumas músicas novas e adesão à mesma foi como se estivessemos perante clássicos. Algo compreensível, tendo em consideração o nível elevado de contágio a que os suecos infectam os seus temas quando os expulsam para o mundo. “Spirit” foi um desses temas onde nem um problema com o pedal do baterista foi suficiente para retirar energia à actuação. Outro foi “Simple” – de tal forma bem recebido que houve membros da assistência que perderam os sapatos durante o mesmo.

Os clássicos da banda foram (quase) todos tocados sendo que “Should Have Known” (fantástica interacção entre o público e o vocalista sueco), “In A Rhyme” (cantada do início ao fim por todos no RCA Club), “Wow I Say Wow” e “Catching Me Running Round” (onde se verificou o que parecia ser uma batalha campal) e claro as já indispensáveis, “Funny?”, “Evil Worms”, “Beat’Em Down” e a apoteótica “Master Celebrator” que colocou um ponto final na actuação.

Foi um daqueles concertos para mais tarde recordar, onde a energia contida definitivamente daria para alimentar uma central termoeléctrica – os níveis de calor no interior do RCA e na forma como quase todos saíram de lá a transpirar devem ter contribuído para algumas constipações. Um concerto onde nos foi provado aquilo que já sabíamos – a música é energia renovável inesgotável para além de ser uma forma de comunicação universal. Impele a saltar, impele a viver e a sentir. São as recordações que ficam numa noite histórica onde o punk rock dominou e mostrou a sua vitalidade no nosso underground.

Texto por Fernando Ferreira
Fotos por Sónia Ferreira
Agradecimentos Hell Xis Agency


Photo Report To All My Friends
Photo Report Artigo 21
Photo Report No Fun At All


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