WOM Report – Trinta & Um, Centopeia @ RCA Club, Lisboa – 14.12.19
Vinte anos de “O Cavalo Mata”. O tempo voa, cada vez mais depressa mas felizmente que não apaga aquilo que é importante e acaba por ser o elemento decisivo na classificação das coisas boas da vida. A estreia discográfica nos álbuns por parte dos Trinta & Um é sem dúvida uma delas. E para comemorar o marco histórico, assinalava-se também a reedição desse mesmo trabalho (com fotografias da nossa Sónia Ferreira) que conta também com um DVD onde está registado o concerto, ainda que parcial, da noite também presenciada por nós (ler reportagem aqui e photo report aqui). E como se não bastassem as razões especiais para estar presente, ainda seria possível presenciar a primeira actuação de uma nova banda, os Centopeia, composta por caras conhecidas do nosso underground.
Foram eles que deram andamento à noite com já uma boa mole humana à sua frente para os receber. Nomes bem conhecidos como Rui Correia (vocalista dos Grankapo e Jackie D.) que sentou atrás do kit de bateria mas não deixou de cantar, Tiago Rato baterista dos Dr. Bifes e Psicopratas (impossível deixar de referir o cartaz gigante com uma foto do Sérgio “Bifes” Curto, representado no elemento em que ele gostava mais de estar, em cima do palco) assumiu a voz, enquanto Zé Miguel Silva, também ele dos Jackie D. e Dr. Bifes e Psicopratas, na guitarra se juntava a José Dinis (dos Dollar Llama) no baixo.
Uma formação de luxo para uma banda que não é de fácil categorização pela pluralidade de géneros e sub-géneros do rock que junta de forma fluída e natural. Com um à vontade impressionante, a banda conquistou rapidamente o público que demonstrou também estar preenchido por muitos apoiantes que não se cansaram de fazer a festa, conhecendo até a letra de alguns temas. Do groove do rock mais southern (ou até sludge) de “Black Heart” e “October 7Th” até a um rock mais explosivo onde a costela punk, não deixa de estar evidente como a “Bad Day” provou. Concerto curto porque a banda também ainda não tem muitos temas mas sem dúvida que foi um primeiro contacto positivo para todos os que presenciaram. Sem dúvida que para nós o foi. Esperemos que em breve venha algum lançamento.
Após uma mudança de palco e preparativos para que estivesse tudo pronto, foi a vez dos senhores da noite subirem ao palco. Com uma intro que mostrava a realidade do nosso país vinte anos atrás e a dele actualmente através de samples de noticiários, pudemos reparar que em vinte anos não mudou assim tanta coisa. Ou pelo menos não melhoraram. A música, essa, continua acutilante como sempre. Mordaz e eficaz, com os primeiros temas do clássico álbum de estreia a serem debitadas. Com “Viver No Subúrbio” a iniciar a ocasião, o público chegou-se logo à frente para cantar os versos que eram debitados com aquela intensidade esperada por parte de Goblin, sempre um mestre de cerimónias generoso e sincero nos seus sentimentos.
A loucura saudável que é um concerto dos Trinta & Um manifesta-se de diversas formas, mas é a festa que o público faz com a música que é memorável. Quando o lendário tema-título foi tocado, foi inesquecível a forma como Goblin se ia mexendo no palco de microfone esticado na mãop, da esquerda para a direita e e da direita para a esquerda e um “enxame” de fãs o seguiam para cantar o refrão de um verdadeiro hino da LVHC. E claro, stage divings com fartura, numa verdadeira festa que nunca é demais presenciar e que nunca envelhece – por outro lado Goblin admitiu que anos atrás não havia tanto espaço entre as músicas, que era tudo de seguida, sem parar. Nada que retire valor à entrega da banda hoje em dia.
Apesar do centro ser obviamente “O Cavalo Mata” – onde a passagem do tempo se assinalou com “Timor Só” que hoje em dia fazia mais sentido se trocarmos Timor pela Palestina e Indonésia por Israel, sendo que o sentido seria o mesmo – não faltaram passagens por “Não Há Regresso” e “Terceiro Assalto”, segundo e terceiro álbum de originais respectivamente, com um alinhamento rico em momentos altos, como “Assaltei o Banco”, “Coma 85” e “Sintra”, tema épico que fechou a noite em beleza – embora tenhamos que referir, e acho que podemos falar por todos os presentes, que poderiam muito bem tocar mais uma hora que ninguém se queixaria.
Um outro momento alto até foi extra-musical, quando Goblin afirmou que a banda estava preparar-se para trabalhar num novo álbum, algo pelo qual vale a pena ansiar. E claro, a homenagem a Sérgio Curto, nunca esquecido, sempre lembrado por quem vive intensamente o hardcore nacional e uma das suas cenas mais ricas. Porque, como o vocalista afirmou antes de começar o hino “LVHC” (quando algumas pessoas responderam à pergunta de quem não era de Linda-A-Velha), não interessa de onde são, são todos de Linda-A-Velha. Não encontramos forma melhor de encerrar o relato de mais uma noite mágica de música nacional no RCA Club.
Texto por Fernando Ferreira
Fotos por Sónia Ferreira
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