WOM Report – Vagos Metal Fest Dia 4 @ Quinta do Ega, Vagos – 12.08.2018
Crónica Editorial – Vagos Metal Fest 2018
Como tudo o que é bom chega ao fim, chegamos agora ao último dia da mais ambiciosa edição do Vagos Metal Fest. Uma verdadeira maratona que previsivelmente iria ter o cansaço como principal inimigo no último dia. No entanto, e apesar dessa expectativa, não deixámos de ser surpreendidos com o número de festivaleiros que apareceram em peso quase desde cedo. E o “quase” também não tardou muito após a primeira actuação.
Comecemos exactamente por aí. Com o som de bácoros a soar forte em frente ao palco Stairway, era oficial: os Stonerust estavam iminentes a entrar em cena com a sua carismática “Man & Pig”. Com um volume alto mas a favorecer todo o groove da banda, que é imenso, e que vive das sonoridades mais próximas do stoner e do southern rock/metal – vai além desses rótulos aliás. A banda de Cascais mostrou-se agradecida tanto pela oportunidade como pelo público presente, ainda que fossem, e citando, “poucos mas bons”. Poder deste não se pode deixar passar em branco.
A segunda banda do dia também subiu ao palco Stairway, e foram os galegos Dark Embrace (que disseram que apesar de serem galegos, em parte são portugueses) que deram andamento ao som que nesta edição foi contínuo (e há quanto tempo andávamos todos nós à espera de algo assim?). Apesar de uma estética mais próximo do metal gótico, o peso e a energia que as suas músicas têm – como “The Call Of The Wolves”. Um daqueles casos abundantes neste festival em que não nos queixaríamos se ouvissemos mais, mas o horário teria de ser respeitado.
Chegaria a hora de inaugurar o palco Vagos, com os suiços Schammasch a serem chamados para trazer a escuridão a Vagos – curiosamente o dia com menos sol do festival – com o seu black metal pouco ortodoxo que terá perdido algum impacto devido ao volume estar demasiado alto mas essa foi uma situação que tal como em ocasiões anteriores, foi sendo corrigida ao longo dos tempos. Se a potência dos suíços em disco já é temível, no palco Vagos , temas como “Consensus” e “Metanoia” foram de fazer tremer o próprio chifrudo – a jarda que vinha das colunas de certeza que abanou prédios no inferno.
Por falar em inferno, algo completamente diferente. Os Feed The Rhino são britânicos e tocam uma mistura muito própria de hardcore e metal que animou o palco Stairway. Poderão pensar se será possível haver uma mistura própria entre estes dois estilos (e a atenção que estamos a falar de algo diferente de metalcore) mas não é preciso muito do som dos ingleses para ficar com essa certeza. A banda não só meteu tudo a mexer como também despejou bom gosto nos arranjos, principalmente na guitarra solo. E como se não bastasse, o vocalista ainda foi para o meio do público e provocou um wall of death digno de ser visto pendurado (e segurado) nas grades que separam o público do palco. No final, o público estava rendido e temos crença que era um sentimento mútuo.
A hora e a razão para voltar ao palco Vagos não poderia ter sido melhor. Ross The Boss (que entrevistámos na nossa mais recente edição que podem ler aqui), o mítico guitarrista original dos Manowar veio a Vagos embalar-nos com alguns dos seus temas mais emblemáticos do seu passado e do presente. A média foi desequilibrada, admitimos (dos nove temas tocados, apenas um foi retirado do mais recente álbum de Ross The Boss, “By Blood Sworn” – o tema “Fistful Of Hate” que fecha o álbum), mas quem é que se pode queixar da oportunidade de ver e ouvir Ross The Boss a tocar temas como “Blood Of The Kings” (que só pecou pelos coros Mike LePond a soarem desajustados), um enorme “Battle Hymns” e a inevitável “Hail And Kill”. Tal como o próprio Ross nos disse na entrevista referida atrás, Eric Adams é insubstituível e único, mas teremos que referir que Marc Lopes não só se enquadra nos temas apesar do seu timbre mais agudo, como também é um animal de palco, exímio em puxar pelo público – no final da já referida “Hail And Kill”, Marc Lopes foi para junto do público, com muitos passavam por ele em crowdsurf. Mais metal que isto não há.
Depois de emoções fortes como estas, nada como (mais) um grande concerto no palco Stairway de uma verdadeira lenda do hardcore norte-americano (e da sua mistura com o metal, muito antes de se inventar o termo metalcore): Integrity. Com uma riqueza sonora impressionante até mesmo para quem não é apreciador de hardcore (basta ouvir a melancólica “Jagged Visions Of My True Destiny” e o seu duelo final entre as duas guitarras) e com uma energia aparentemente inesgotável, os norte-americanos puxaram pelo público e este respondeu sempre à altura. Acabaram com a “Hybrid Moments” dos Misfits, este que foi o último concerto da digressão.
Podemos considerar como luxo passar do palco Stairway depois de termos levado uma tareia dos Integrity para o palco Vagos para levar o mesmo tratamento (ao quadrado ou ao cubo) por parte dos compatriotas Municipal Waste. E nem a chuva que começou logo a cair no primeiro tema, “Grease Peace” estragou a festa. Tony Foresta, o vocalista, confessou um amigo ter-lhe dito que sendo o último dia do festival, que o público estaria provavelmente mais apático e cansado. “Bullshit!” disse o norte-americano. Justiça seja feita, nem que o público estivesse morto deixaria de reagir a malhões como “You’re Cut Off” e “Slime & Punishment” (este último motivo para uma wave of death – ou seja, crowdsurf em barda que depois fez com que Foresta elogiasse os seguranças que estavam responsáveis por recolher as pessoas que iam chegando na “onda”). “The Art Of Partying” e “Born To Pary” colocaram um ponto final a um dos grandes momentos altos do festival.
Uma das grandes (e melhores) características desta edição do Vagos Metal Fest foram sem dúvida as guinadas estilísticas de banda para banda. Passar do crossover thrashado e vitaminado dos Municipal Waste (o próprio Tony Foresta referiu que tinha estado a ver as bandas anteriores e salientou a qualidade de todas elas, Ross The Boss incluído. Não existem tribos, não existem separações, o metal é unido) para o folk acústico dos Ensiferum não é para todos. Apenas em Vagos algo assim poderia resultar na perfeição como resultou. A banda finlandesa ficou sem instrumentos e graças à Câmara Municipal de Vagos, puderam dar um concerto especial, o segundo da sua carreira neste formato fora da Finlândia (o primeiro foi em França semanas atrás pelo mesmo motivo – extravio dos instrumentos nos vôos, referido em tom de brincadeira por Sami Hinkka, baixista, como um dos hobbys da banda). Tivemos um grande concerto que proporcionou muitos momentos altos e que meteu todos a mexer – e tocar seja o que for em acústico prova a qualidade dos músicos, porque não existe distorção para disfarçar enganos – com versões de “Wanderer” e “Two Of Spades” a serem memoráveis, sem falar do primeiro acoustic mosh a acontecer em Portugal a ser precisamente no Vagos Metal Fest. Where else?
Um momento tão intimista como o vivido no palco Stairway só tem mais impacto quando multiplicado por mil. Podemos falar de muitas maneiras de um concerto como Suicidal Tendencies. Para muitos foi uma oportunidade única de ver uma banda histórica em Portugal, um desejo tornado realidade. Para outros não havia mais que uma mera curiosidade. Garantimos que todos estiveram perante um dos melhores concertos do Vagos, desta ou da outra senhora. Independentemente dos gostos pessoais de cada um, a forma como a banda de Mike Muir se conseguiu conectar a todos, com um som do melhor que pode haver, onde todos os detalhes da guitarra de Dean Pleasants (que solava como se a sua vida dependesse disso) eram perceptíveis – logo no início com um enorme “You Can’t Bring Me Down” – fizeram desta actuação memorável.
Grande destaque, além do já dado a Dean Pleasants, terá de ser dado à secção rítmica composta pelo enorme talento que é Ra Díaz (que baixista fenomenal) e o senhor Dave Lombardo, lenda viva do thrash metal. E, claro, o senhor Mike Muir, que conseguiu o feito de se dirigir aos milhares presentes no recinto como se estivesse a falar directamente com cada um de nós. A dar conselhos, a contar histórias da sua vida, a desabafar sobre o mundo, sobre as coisas que guardamos cá dentro, sobre raiva, sobre amizade, sobre amor, sobre união. Coisas que fizeram com que temas em que habitualmente não são os primeiros em que pensamos como “Trip At The Brain” e “War Inside My Head” (esta última com a participação de Tony Foresta dos Municipal Waste), soassem muito bem. Mas obviamente que “Lost Again”, “I Saw Your Mommy” e a seminal power ballad “How Will I Laugh Tomorrow” que desaguou numa épica “Pledge Of Allegiance” que levou praticamente Vagos Metal Fest para cima do palco, aos saltos (nota para quem construiu o palco: está aprovado, se o mesmo não caiu com aquela verdadeira multidão, nem com o meteoro a coisa vai abaixo) e em êxtase num final que ficará na memória de todos.
Seria difícil superar algo assim, confessamos. No entanto, mais uma vez, é este o espírito de Vagos. Não é querer superar experiências que são irrepetíveis, é apresentar experiências que são diferentes mas igualmente boas. Como foi o concerto dos Memoriam (que segunda a informação que pudemos recolher, estavam a tocar com instrumentos emprestados – alguém nas companhias aéreas tem um negócio paralelo com a redistribuição de instrumentos musicais), que foi um exibir de classe a provar toda a qualidade do death metal inglês. Não deixamos de pensar em Bolt Thrower e Benediction ao ouvir temas como “Dronestrike V3” e “Soulless Parasite” que soa muito bem ao vivo. Muito melhor que em disco (“The Silent Vigil”) cuja produção é bastante fraca. Karl Willets esteve muito bem disposto e contagiou todos com a sua atitude boa-onda e também, obviamente, pelo seu gutural que já faz parte da história da música extrema.
O fim estava a chegar e como dissemos dias atrás aquando o primeiro dia, a posição de abertura e fecho é sempre ingrata, podendo haver o risco de se tocar para um número mais reduzido e/ou apático devido ao cansaço. Não poderia haver banda melhor para motivar todos os presentes a não irem embora assim como a obrigar os cansados a esquecer as suas limitações físicas. Teremos que referir obrigatoriamente o volume estupidamente alto com que a banda tocou mas tendo em conta que a primeira vez que os vimos foi igual, temos em crer que não se trata de defeito do festival e sim feitio da banda. Ainda assim, o poder de “Ergue A Foice”, “Faca Romba” e “Homem Ao Mar” bateu forte como é inevitável que aconteça, havendo ainda direito a homenagem aos irmãos Abbott, com a cover de Pantera, “Fucking Hostile”. Luxo.
No final, a maior sensação que fica é do vazio mais rico que pode haver. Vazio porque chegou ao final algo único, algo que marcou inegavelmente todos os que por Vagos passaram. Rico porque as memórias vão acompanhar para sempre os milhares de pessoas que durante quatro dias (ou mais) fizeram daquela a sua casa. Que já o fizeram no passado e que querem fazer novamente. Tendo sido uma aposta ambiciosa, será de esperar que acontecessem coisas menos boas, coisas que tenham custado mais a afinar – e é inegável que ao longo dos quatro dias pudemos assistir a uma evolução positiva – mas contrário ao que é costume acontecer no nosso país, é através do risco e do sonho em querer algo mais que se consegue evoluir. Vagos Metal Fest evoluiu. Para melhor, para maior. Mas continua a ser aquilo que sempre foi, a meca do metal nacional. Até para o ano, até Vagos!
Texto por Fernando Ferreira
Fotos por Sónia Ferreira
Agradecimentos Amazing Events
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