A Day At The Movies – Joker
Ver este filme foi uma autêntica aventura. De uma oportunidade que surgiu no dia das eleições que não pude aproveitar, até agenda cheia apenas vaga numa noite em que todos resolveram sair de casa para ver o filme e depois, dois dias depois, num cinema onde há sempre bastante paz e tranquilidade – e ar em redor – apanhar uma sessão praticamente esgotada onde apenas se arranjou lugares para a terceira fila. Dissemos a nós próprios – de hoje NÃO PASSARÁS! E não passou. Ah, só para avisar… SPOILERS!
Muita expectativa para ver este filme e posso dizer que por parte do público presente também. Tinha a certeza de que este não era um filme de super-heróis, nem sequer representativo da nova fase (e algo duvidosa depois da saída de Henry Cavill como Super-Homem e da escolha de Robert Pattinson como Batman) do chamado DC Extended Universe. É quase como a mesma premissa da trilogia de Christopher Nolan, transportar a personagem para o mundo real – embora a mesma também se pudesse encaixar na DCEU sem grande esforço. Joaquin Phoenix não seria a escolha mais óbvia para o papel e assim que soube de notícia pensei “o que é que eles andam a inventar outra vez? Estão a ser cilindrados pela Marvel e agora metem-se com estas experiências malucas.” Bem, pode-se dizer, sem exagero, que esta experiência poderá resultar em óscar. E tal não é forçado. É totalmente merecido, principalmente pela actuação de Phoenix.
É uma abordagem à personagem que nunca tinha sido feita. Talvez a mais humana. Se no primeiro Batman, Nicholson mostrou um criminoso enlouquecido por questões químicas, e se no Cavaleiro das Trevas ficamos tão siderados pela interpretação de Ledger que nem precisamos questionar o porquê de existir uma personagem tão extrema (e com múltiplas versões de como ele se tornou naquilo que era), aqui encontramos alguém que tenta desesperadamente encontrar o seu papel na sociedade, tentando adaptar-se a todo o custo até que depois da sociedade o ridicularizar e espezinhar, ele finalmente aceita aquilo que é. Até a condição (real) que sofre, torna tudo ainda mais perfeito e a personagem mais sólida.
Não é um filme fácil de ver, não é o chamado filme-pipoca, nem tanto é um filme que se reveja de ânimo leve para passar um “bom momento”, mas é também um filme que nos marca e que lida com questões que são cada vez mais sintomas da sociedade moderna. Mesmo sendo um filme que se passa no início da década de oitenta- e nesse ponto, a nível de imagem e estético, está um trabalho fantástico. Poderia dizer-se que era realmente filme da década de setenta. A principal questão é a de insensibilidade. Como a personagem diz no filme, mais coisa menos coisa, “eu podia cair no chão que ninguém se importaria comigo”. Esse retrato daquilo que nós somos, dessa desumanização que, curiosamente, se sentiu no cinema quando o público, ou parte dele, riu em cenas em que a sua doença mental se manifestava, cenas que não tinham nada de humor. Ao contrário do chavão já gasto que diz do “pensava que a minha vida era uma tragédia, mas na realidade ela é uma comédia”, esta é mesmo uma tragédia.
Muito para nos fazer pensar. E no entanto, no final, essa é a parte definitiva, quando a psicóloga lhe pergunta porque é que ele se estava a rir – talvez a única gargalhada sincera de todo o filme – e ele responde após uma pausa “Não iria perceber”. É a parte em que nos desarma e ficamos sem a certeza daquilo que vimos. Se foi algo imaginado, mais uma fantasia delirante por parte de alguém doente. Não há conclusões definitivas, nem mesmo em quem chamamos de herói ou vilão. E é nesse ponto que o filme se assume como uma inquietante obra que não queremos rever, embora continue a ter um lado do Joker (independentemente de ser mesmo ele ou não) que é definitivamente o que nos faz ter mais simpatia pela personagem. E aí é que está o remate final da piada – sentir simpatia por uma personagem através de alguém que não a encarna. Pelo menos não como esperávamos. Ou então encarna e simplesmente nos disse aquilo que queríamos ouvir. Como quiserem encarar. É um sem fim louco de possibilidades.
Nota 9/10
Review por Fernando Ferreira
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