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Filhos do Metal – Será Que O Heavy Metal Atual Perdeu A Alma?

Por Duarte Dionísio
(Filhos do Metal – À descoberta do Heavy Metal em Portugal)
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A capacidade criativa de um individuo tem na base diversos fatores. Destaco três que serão primordiais: o talento, a técnica e as circunstâncias externas do mundo que o rodeia. O talento é algo que não se aprende, ou se tem ou não, é inato. A técnica pode ser adquirida com trabalho e dedicação. Quanto mais desenvolvida e apurada é a técnica, mais fácil se torna expor o talento. O mundo que rodeia uma pessoa e as circunstâncias de determinado momento podem ser o motor que aciona o talento e a técnica, resultando na criatividade. Esta constatação ajuda a perceber muito do que é hoje o Heavy Metal em todo o mundo e principalmente em Portugal. No nosso país houve um enorme desenvolvimento na criação e execução do género, mas principalmente ao nível técnico. Hoje é mais comum encontrar músicos com elevada técnica que conseguem mostrar o seu talento em músicas com mais originalidade e identidade própria. É fácil de comprovar que a quantidade de músicos e bandas a compor e tocar Heavy Metal resulta em maior qualidade. Mas será que é mesmo assim?

A questão é pertinente. Vem a propósito uma entrevista que Thomas Gabriel Fischer (Tom G. Warrior dos Hellhammer, Celtic Frost, Triptykon) deu à Red Bull Music Academy há já algum tempo, podem ver um excerto aqui: https://www.youtube.com/watch?v=de7hm-U31YM. Essa conceituada figura do Heavy Metal mundial expressa a sua opinião sobre o que se produz atualmente dentro do género musical. Tom G. Warrior afirma que para ele o Metal é sinónimo de anarquia, revolução, energia. Que sente a falta de paixão, imperfeição, sujidade que são apanágio da música pesada. Diz ainda que respeita a perfeição e a técnica de algumas bandas atuais, mas não entende qual é o propósito. Parece que as bandas entram em competição, como se fossem as Olimpíadas do Heavy Metal, para ver quem consegue tocar a maior quantidade de notas por minuto de forma perfeita. No fundo, na opinião dele o Heavy Metal parece ter perdido a chama. Eu compreendo todo o raciocínio que ele faz e consigo identificar-me com alguns dos sentimentos que ele expressa. Talvez seja da idade, como ele próprio diz a determinada altura. Eu também gosto que a música tenha alma, chama, que respire, que seja orgânica, que nos faça sentir e ouvir os instrumentos em vez de máquinas. Na maioria das gravações atuais, os instrumentos passam por tanta tecnologia em estúdio que perdem a sonoridade que os caracteriza. Por vezes, passam diretamente para o computador em gravações caseiras.

Reforço a ideia que na minha humilde opinião, eu prefiro ouvir um disco gravado de forma analógica, em fita, onde os instrumentos soam orgânicos. No entanto, não concordo com o Tom G. Warrior no discurso fatalista, dando a entender que o Heavy Metal atual perdeu essência. Só por si e intrinsecamente, pressupõe-se que a evolução é prejudicial. Porque é disso que se trata. Não podemos negar nem travar a evolução. Todo o potencial que a tecnologia, software e demais ferramentas inovadoras trouxeram à gravação e até à composição, não pode ser escamoteada. Apesar de se querer ser perfecionista ou tecnicamente evoluído e utilizar o que a tecnologia coloca à disposição dos músicos, não significa que não haja criatividade. Como disse no início do texto, considero que em Portugal toda esta evolução tem sido benéfica. Poderia mencionar uma mão-cheia de bandas cujo trabalho é deveras interessante, no mínimo, e que utilizaram ferramentas digitais. Talvez os álbuns já não tenham a sonoridade dos anos 60 ou 70. Talvez não sejam orgânicos como os álbuns do início de carreira de uns Black Sabbath ou Led Zeppelin, mas por certo têm talento, técnica e notam-se as influências deste mundo atual, cheio de problemas, revoltas, guerras, pandemias, energia. É evidente que quanto maior é a quantidade de bandas, maior é a probabilidade de se repetirem fórmulas. Assim como é mais difícil encontrar uma banda deveras interessante no meio da imensidão de projetos que há hoje. Mas temos de aceitar o futuro e continuar a apreciar o que de bom o passado nos ofereceu. Eu também prefiro grelhados no carvão, mas um dia isso acabará. No entanto, eu quero continuar a comer grelhados. O Heavy Metal ainda tem fogo e alma!


 

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