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Filhos do Metal – De Dentro Para Fora

Por Duarte Dionísio
(Filhos do Metal – À descoberta do Heavy Metal em Portugal)
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A música por si só não existe sem quem a componha, interprete, produza, grave, divulgue, até ser ouvida e consumida. Existe um caminho e um processo entre músico e público consumidor. Isto, claro, numa perspetiva comercial, analisando a música enquanto produto. Os músicos têm como objetivo a divulgação das suas composições, espalhar a sua arte de forma abrangente, de modo a chegar ao maior número de pessoas possível. Isso acontece através de uma rede de agentes e profissionais com diferentes funções que afunilam para o mesmo objetivo, expor a música. Mesmo com o advento da digitalização e a massificação das plataformas de streaming, continuam a existir profissionais e empresas entre o músico e o público. O músico e a sua criatividade são apenas o começo de uma sequência de elos, que interligados formam a corrente que leva a música ao seu destino final, o ouvinte. Um dos elos é, ou pode ser, a editora. O “pode ser” aqui é intencional. Há muitos músicos que optam pela independência editorial, assumindo eles próprios a tarefa de lançar as músicas para o mercado. Essa decisão acarreta algumas limitações, desde logo a falta de recursos para expor de forma mais abrangente o produto. É neste contexto que a opção exclusivamente digital assume o papel principal. Muitos músicos e bandas fazem edições exclusivamente digitais, sem a produção de um artigo físico. Por não conseguirem um contrato discográfico ou por manifesto desinteresse para com os meandros editorias de uma editora. Mas nem sempre foi assim!

Quando a era digital ainda era uma miragem, depois de compostas umas quantas músicas na sala de ensaios e meia dúzia de concertos para os amigos, começava a senda pela procura de um contrato discográfico. Essa sempre foi a maior dificuldade para as bandas de Heavy Metal em Portugal. Nos anos 90 surgiram diversas editoras independentes cá por terras lusas, que começaram a aumentar significativamente a quantidade de edições de álbuns, maioritariamente em CD. No entanto, essas estruturas eram mais movidas pelo entusiasmo e pelo amor à camisola, do que pelo negócio com perspetivas de internacionalização. Era difícil sair de dentro para fora de Portugal. Estávamos um pouco longe e isolados do centro das decisões, do circuito.  Daí, as bandas continuavam a sonhar com o contrato discográfico com uma editora internacional. Foram raras as oportunidades poucas bandas conseguiram esse objetivo. Os casos mais conhecidos tiveram verdadeiro sucesso. Volvidas algumas décadas o paradigma mudou, mas será que com essa mudança veio também a bonança? Vejamos!

Um contrato discográfico pode ter muitas facetas. A corrente que liga banda e público tem muitos elos, alguns deles podem estar inseridos num contrato com uma editora. Mas pode acontecer que essa editora não tenha a capacidade de oferecer uma corrente forte, com os elos necessários. Não querendo entrar em demasiados detalhes, refiro apenas alguns exemplos. Uma editora pode ser responsável pelo financiamento da gravação de um ou mais discos, pela produção e execução dos discos, pela divulgação e pelo suporte financeiro de digressões. Sabemos que há já algum tempo a venda de discos físicos caiu a pique, devido à era digital. Isso fez diminuir o investimento por parte das editoras. Mudou também a abordagem dessas empresas cujo negócio teve de se adaptar a uma realidade em mutação constante. Constatando este cenário seria de esperar uma ainda maior dificuldade para as bandas de Metal nacional conseguirem contratos discográficos. Mas não. Pelo contrário! Atualmente são já muitas as bandas com edições em selos estrangeiros. Acontece que a grande maioria tem correntes curtas para ligar ao público. Ou seja, as edições existem, mas falta maior suporte, nomeadamente para digressões. Mas não só as editoras falham no suporte, como faltam outros agentes que complementem a rede necessária à expansão das bandas. Estou, obviamente, a falar de editoras de pequena dimensão, que apesar de serem estrangeiras não significa que tenha estrutura para uma grande distribuição, promoção e suporte a digressões. Vejamos alguns exemplos. Os Tarantula editaram três álbuns pela alemã AFM – “Light Beyond The Dark” (1999), “Dream Maker” (2001) e “Metalmorphosis” (2005). Neste caso trata-se de uma editora já com uma dimensão relevante. Foi um passo importante para a banda, com toda a exposição internacional que isso lhes trouxe, mas será que foi suficiente para maiores voos? Por indisponibilidade da banda ou outros motivos editoriais, os Tarantula não conseguiram uma carreira internacional de sucesso. É isso que importa. É a esse objetivo que me refiro, quando falo de editar por uma editora internacional, ainda que independente. Mais exemplos. Os Decayed têm um longo historial de edições em pequenas editoras estrangeiras, que eventualmente começou em 1999 com “The Book Of Darkness” com edição pela francesa Drakkar Productions, tendo diversos splits em outras editoras fora de portas. Os Filii Nigrantium Infernalium contam já com três álbuns na francesa Osmose Productions – “Fellatrix” (2018), “Hóstia” (2018) e “Pérfida Contracção do Aço” (2024), só para mencionar os mais recentes. Os Holocausto Canibal já editaram em selos de Espanha, Alemanha, EUA, Itália, Chéquia e na polaca Selfmade Records onde lançaram em 2022 “Crueza Ferina”. Os Blame Zeus lançaram “Seethe” pela italiana Rockshots Records. Os Enchantya editaram “Dark Rising” pela alemã Massacre, tendo depois assinado com a finlandesa Inverse Records onde já concretizaram três edições. Os Attick Demons lograram assinar contrato para lançar “Daytime Stories… Nightmare Tales” pela Rock of Angels da Grécia (que agora é uma divisão da Reigning Phoenix Music), já depois de terem editado pela alemã Pure Steel Records. Os In We Fall lançaram em dezembro do ano passado “Inner Self” pela americana Eclipse Records. Já este ano foi editado um split com duas bandas recentes, os Cult Of Alchaeus e os Necro Algotithm, com selo da italiana Nova Era Records. Poderia mencionar outros casos, no entanto, estes são exemplos suficientes para demonstrar que nem sempre editar “lá fora” significa sucesso. As condições e contratos com estas editoras revestem-se de contornos bem diferentes do sonho de lançar um disco e fazer carreira internacional.


 

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