WOM Report – Moita Metal Fest – Dia 2 @ Largo do Pavilhão Municipal de Exposições, Moita – 06.04.19
Se o primeiro dia foi estrondoso (como poderão verificar aqui), este segundo dia prometia superá-lo graças a um cartaz bem forte e, claro, mais numeroso. Mais bandas e a começar mais cedo, onde mal se teve tempo para se descansar para voltar à carga para uma dose da diversão movida ao melhor que o underground nacional e internacional tem para oferecer.
A começar, Moonshade. A banda do Porto teve as honras de abrir o segundo dia do Moita Metal Fest, uma posição sempre ingrata, já que, independentemente de ter havido concertos no dia anterior ou não, as primeiras bandas são sempre sacrificadas. Isso não invalidou a entrega nem sequer a componente cénica que assenta no conceito do seu álbum de estreia “Sun Dethroned”, que foi também o foco de toda a sua actuação. Começando com essa representação, o primeiro tema foi o contagiante “The Flames That Forged Us” que é sempre uma boa combinação entre peso e a melodia. O público ia chegando aos poucos mas ainda assim, perante a qualidade de temas como “World Torn Asunder” e “Sun Dethroned” mereciam ter uma sala cheia. Encheram as medidas dos presentes, missão cumprida com excelência.
Como já se tinha referido, o Moita Metal Fest é sinónimo de diversão e diversidade musical. E embora este segundo dia pendesse mais para o lado mais punk e thrash, a transição do death metal melódico dos Moonshade para o thrash metal vitaminado e cheio energia dos Mindtaker foi completamente natural, sendo que a banda alentejana beneficiou de mais público que entretanto continuava a chegar, mas isso não impediu que Philip Brotas, frontman, se queixasse da falta de movimento no público, referindo-se à ressaca do dia do anterior. Ainda assim, Os Mindtaker nunca desanimaram e nunca fraquejaram na sua missão de trazer ao público o melhor do thrash metal com temas como “Into The Pit”.
E já que estamos a falar de thrash, como não mencionar a porrada sonora que é sempre uma actuação dos Infraktor. O álbum “Exhaust” foi um dos melhores álbuns thrash de 2018, e as suas actuações são sempre um festim para os ouvidos ávidos de acção metálica. Uma sala já muito bem composta recebeu malhões como “Speech Of Deceit” e “Son Of A Butcher”. Em “Ferocious Intent”, Hugo Silva chamou ao palco Raça, vocalista dos Revolution Within, para partilhar a voz em palco, tal como havia tinha feito em disco. O tema-título do referido álbum de estreia foi precisamente o que encerrou a actuação de uma banda que é sempre um absoluto prazer presenciar ao vivo. Uma banda que faz sempre sucesso no Moita e em 2019 não foi excepção.
Mais uma vez, uma viragem no estilo musical mas mais uma banda nacional de grande qualidade. Os The Voynich Code têm lançado excelentes álbuns na sua sonoridade muito própria que tem tanto de prog como de djent, onde a intensidade das sonoridades modernas se juntam a um virtuosismo digno de apreciação atenta. Não será alheio a esse facto a formação invulgar da banda onde prima a ausência de baixista, com as duas guitarras a serem o principal fio condutor tanto na criação de ambiências como nos fantástico solos. Tecnicamente irrepreensíveis, a banda conseguiu agarrar o público, brindando-o até com um novo tema. Certamente uma (boa) surpresa para quem não conhecia e confirmação para quem os tem acompanhado.
Voltando para coisas mais thrash, os Diabolical Mental State misturam o groove das tendências mais modernas do thrash com muito da sua violência old school e ao acompanhá-los durante várias actuações nos últimos tempos, é apreciável a forma como eles têm vindo a evoluir e com o álbum de estreia lançado recentemente, mais motivação havia para darem o grande concerto que deram. “The Village” intercalou entre o EP de 2014 “Basic Social Control” e o já referido “Diabolical World”. Destaque para “The Town” (que no disco contou com a participação de Hugo Andrade dos Switchtense e da organização do Moita Metal Fest e que a banda ainda lançou o desafio para que subisse ao palco mas o mesmo não foi atendido) e “Home Invasion”, com um grande duelo de guitarras.
Portugal continuou a dominar e não é por acaso que mencionamos isto quando nos preparamos para falar dos Artigo 21. Com um grande álbum fresquinho nas mãos, “Ilusão”, a banda é um poço de energia contagiante e temas como “Só Mais Um Bocado” e “Nada a Perder” que sempre são autênticas injecções de adrenalina no coração. Ainda assim o público parecia estar algo apático mas a apreciação foi global. “Fantasma” e “Ódio Não é Amor” foram outros dois temas que provam o poder da banda, que através de Cardoso, o seu frontman, agradeceu à organização pela aposta no punk e em como a união dos dois géneros (punk e metal) resulta naquele em qualquer outro contexto. Pena que não houvesse mais tempo para ouvir o hino “Espera Por Mim”, que ficou a faltar.
Depois do positivismo dos Artigo 21, chegam as trevas na figura dos Gaerea, que por esta altura já não têm nada a provar a quem quer que seja mas que continuam a dar sempre um grande espectáculo, independentemente do palco em que actuam. Com apenas um álbum e um EP, o impacto da banda é sempre alto e a componente cénica e o facto do foco estar completamente concentrado na música, seja pelo impacto hipnótico de malhões como “Absent” ou “Whispers” ou mesmo pela ausência de comunicação com o público faz com que este seja hipnotizado e imerso nos seus próprios sentidos e emoções. E se um concerto num espaço mais intimista é provavelmente aquilo que se julgaria adequado, o Moita não se ficou atrás em nada. Sem surpresas.
Sem surpresas de impacto foi a actuação trituradora dos Simbiose que nos atingiu, a nós e a todos os presentes, como uma bulldozer que entrou a matar, despejando uma rajada de temas sem respirar. Como Johnie referiu, este é um local onde underground é vivido e sentido como nenhum outro e malhões já incontornáveis como “Modo Regressivo” e “Ignorância Colectiva” são sempre bons motivos para circle pits (que aconteceram com bastante frequência ao longo de todo este concerto) e moshada valente. A gozarem do som de luxo – não só forte e poderoso como bem definido, esta é uma daquelas bandas que nunca falha na sua eficácia e potência.
Também na linha do grind, mas com a vertente mais gore, vieram os mestres Holocausto Canibal, que apesar de ter um pouco mais de complexidade nas suas composições, em termos sonoros não houve nada que tenha sequer soado abaixo da perfeição. Como já é costume tanto na banda como na própria sonoridade, a banda ia tocando rajadas de temas de seguida, apenas depois se dirigindo ao público, sendo um desses blocos dedicados ao baterista, Diogo Pereira (também nos Pestifer), por ser o aniversário da entrada dele na banda. Obviamente que os circle pits foram uma constante e aqui até foram bem avantajados. Ficámos com a ideia de que a actuação terá acabado mais cedo que o previsto, talvez para compensar algum atraso que se tivesse a verificar. Ainda assim, sublime.
A noite seria finalizada pelo restante contingente internacional, quatro nomes fortes que garantiriam diversão punkometálica de valor garantido. A começar os suecos Dr. Living Dead, um dos nomes mais interessantes do crossover mais recente. Olhando para a apresentação da banda em palco, quase nos faz lembrar como se fossem os Suicidal Tendencies em modo caveira. Considerações de moda aparte, assim que os quatro mascarados entraram em palco e o som começou a rolar, a acção em frente ao palco foi imediata, com grandes circle pits que tiveram como banda sonora “Can’t Kill The Dead” e “Gremlins Night” – o que dá uma boa analogia para o caos no público.
“No Way Out” foi dedicada a todos os punk rockers no público por um sempre simpático Dr. Mania enquanto o tema-título do último álbum de originais, “Cosmic Conqueror” teve o seu aviso em como o circle pit seria gigante. Assim foi. Perante a pergunta “Querem Mais”, Dr. Slam, o baterista, começa a tocar a intro da “Painkiller” dos Judas Priest, à qual se juntou brevemente as guitarras. Não foi a “Painkiller” mas foi a “Infiltrator/Exterminator” que tem quase a mesma mensagem. E até à recta final, foi um desfilar de exibição energética tanto pela banda como pelo próprio público onde “UFO Attack” e “Dr. Living Dead” foram os dois temas finais. O contexto perfeito para esta banda, onde não terão havido reclamações certamente.
Os No Fun At All eram outro dos grandes nomes, bastante aguardados para esta edição de 2019. Como tal, não os surpreendeu o ambiente de festa com que a banda de Ingemar Jansson foi recebido. Na nossa memória estava bem fresca a memória da passagem épica pelo RCA Club no ano passado (ler reportagem aqui) e pelos vistos na memória deles também já que o vocalista Ingemar perguntou precisamente, a meio do concerto, quem tinha estado presente nesse mesmo concerto, referindo-se a ele como grande. E talvez por esse impacto ter sido tão grande é que se esperava que, pelo menos da parte do público, tivesse um caos maior.
Não foi mas o espectáculo também não prejudicado por causa disso. Conforme uma frenética “Lose Another Friend” ou uma viciante “Wow And I Say Wow”, as movimentações eram constantes e as tiradas constantes de Ingemar denunciavam que a banda estava muito feliz por estar ali, com toda aquela reacção entusiástica à sua música. A sequência final foi de tirar o fólego com “Master Celebrator” a terminar uma actuação boa para fazer uma sessão de aeróbica, punk rock style. Festa autêntica, com os verdadeiros mestres celebradores que têm no nosso país sempre um porto seguro para a sua música.
Nome de culto do grindcore, com raízes fincadas no crust/hardcore, os britânicos Extreme Noise Terror foram, na nossa opinião, como a banda que encontrou mais dificuldades em termos sonoros. Entraram de forma bruta (afinal, estamos a falar de Extreme Noise Terror) mas as duas vozes estavam um bocado mais altas na mistura do que aquilo que seria benéfico. No entanto, os problemas que a banda se queixava, daquilo que nos apercebemos, foi de que o som de palco era praticamente inexistente, levando a que mais à frente no concerto, Ben McCrow dissesse que nunca tinham tido um som tão mau em cima do palco e que estavam a tocar às apalpadelas.
Independentemente desses problemas, isso não impediu que o público recebesse da melhor forma malhões como “Lame Brain”, “False Prophet” ou “Raping The Earth”, dedicada a Phil Vane, vocalista original que faleceu em 2011. São mais de trinta anos de uma mistura vencedora de crust/grind com death metal que teve uma eficácia acentuada entre o público, dando-lhe o combustível ideal para muitos e constantes circle pits. Depois da cover dos Sham 69, “Borstal Breakout”, os dois vocalistas dirigiram-se ao público ao mesmo tempo, o que nos impediu de perceber o que disseram, mas a actuação ficou por ali, ficando-nos a ideia que esta também teria sido encurtada.
A última banda a subir ao palco foi também a primeira a ser confirmada: Decapitated. Com um soundcheck a demorar imenso tempo (isso já nem falar do volume absurdo com que se ouviu os primeiros temas dos Metallica “Ride The Lightning), com a banda também a queixar-se em relação ao som de palco, pelo o que percebemos. Isso só fez com que as expectativas fossem ainda mais elevadas e não foram defraudadas. Não só a banda teve direito a um som triturador, como as próprias malhas (“Kill The Cult”, “Visual Desulusion” e “The Blasphemous Psalm To The Dummy God Creation”) evidenciavam em todo o seu esplendor a componente ambiental que não ficou confinada ao estúdio.
Claro que para o público – arrisco a dizer, com a maior enchente de todo o festival – isso era uma desculpa para mais de um bocado de exercício ao som do death metal bem característico dos polacos. Este facto não passou despercebido a Rafał Piotrowski, vocalista dos Decapitated que agradeceu a todos os fãs por todo o apoio à banda em todos os anos de existência, e por todos os momentos menos bons. Para esses, sobretudo fãs da primeira fase da banda, os dois últimos temas foram particularmente especiais. O hino “Spheres Of Madness” – visão fantástica ver todo um muita a fazer headbang – e o tema título do álbum de estreia “Winds Of Creation” fecharam de forma insuperável não só um grande concerto, como um grande festival.
O Moita Metal Fest em 2019 foi sem dúvida, da nossa perspectiva (e sem qualquer acesso a estatísticas oficiais) um grande sucesso. Mais uma vez, um grande cartaz ajuda mas é o espírito de irmandade presente que torna toda a temática de divisões entre o metal (e os vários subgéneros) e punk/hardcore (e várias variantes) sem qualquer peso e importância. E se acreditam o contrário, apareçam por cá no próximo ano e comprovem. Moita é um caso de sucesso, sempre. Essa é a convicção de todos os fãs de música que saíram da tenda no Largo do Pavilhão Municipal de Exposições.
Texto por Fernando Ferreira
Fotos por Sónia Ferreira
Agradecimentosa Moita Metal Fest e GuilhermeHenriques
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